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As Crônicas dos Kane - CAP. 4

.. sexta-feira, 1 de março de 2013 Nenhum comentário:

Raptada por alguém não tão estranho


SADIE

EU SIMPLESMENTE ADORO REUNIÕES DE FAMÍLIA. Muito aconchegantes, com as guirlandas de Natal emoldurando a lareira, um delicioso bule de chá e um detetive da Scotland Yard pronto para prender você.
Carter estava encolhido no sofá, abraçado a bolsa carteiro de nosso pai. Não sei por que a polícia permitiu que ele ficasse com aquilo. Devia ser uma prova ou alguma coisa do tipo, mas o inspetor nem parecia notá-la.
Carter parecia horrível – quer dizer, ainda pior do que de costume. Francamente, o menino nunca tinha estado em uma escola de verdade, e ele se vestia como um professor em início de carreira, com calça cáqui, camisa de botões e mocassins nos pés. Ele não é feio, acho. É razoavelmente alto, está em forma, e os cabelos não são tão ruins. Ele tem os olhos do papai, e minhas amigas Liz e Emma até disseram que ele é sexy quando viram sua foto, um comentário que devo considerar com certa moderação porque (a) ele é meu irmão e (b) minhas amigas são meio malucas. Com relação às roupas, Carter não saberia reconhecer o que é sexy nem que caísse sobre sua cabeça.
[Ah, não olhe para mim desse jeito, Carter. Você sabe que é verdade.]
De qualquer maneira, eu não devia ser tão dura com ele. Meu irmão estava ainda pior do que eu com o desaparecimento de papai.
Vovó e vovô estavam sentados com ele, um de cada lado, e pareciam bem nervosos. O bule de chá e um prato com biscoitos haviam sido deixados sobre a mesa, mas ninguém se servia. O inspetor Williams ordenou que eu me sentasse na única cadeira disponível. Em seguida, começou a andar diante da lareira com ar de grande importância. Dois outros policiais estavam parados diante da porta da frente – a mulher de antes e um guarda grandalhão que não tirava os olhos dos biscoitos.
— Sr. e Sra. Faust — começou o inspetor Williams — receio termos aqui duas crianças que não querem cooperar.
Vovó mexia na bainha do vestido. É difícil acreditar que ela tenha algum parentesco com nossa mãe. Vovó é frágil e sem cor, como uma pessoa desenhada com palitinhos, enquanto, nas fotos, mamãe parece sempre muito feliz e cheia de vida.
— São só crianças — ela conseguiu dizer. — Certamente, não pode culpá-las.
— Ah! — exclamou meu avô. — Isso é ridículo, inspetor. Eles não são responsáveis!
Meu avô é ex-jogador de rúgbi. Ele tem braços grandes, a barriga redonda demais para caber na camisa e olhos fundos, como se alguém os tivesse socado (bem, na verdade, meu pai os socou há alguns anos, mas essa é outra história). A aparência de vovô é assustadora. Normalmente, as pessoas desviam do caminho dele, mas o inspetor Williams não parecia impressionado.
— Sr. Faust — disse ele — já imaginou como serão as manchetes dos jornais de amanhã? “British Museum atacado. Pedra de Roseta destruída.” Seu genro...
— Meu ex-genro — corrigiu vovô.
— ... provavelmente foi pulverizado na explosão, ou fugiu, e nesse caso...
— Ele não fugiu! — gritei.
— Precisamos saber onde ele está — continuou o inspetor. — E as únicas testemunhas, seus netos, recusam-se a dizer a verdade.
— Nós dissemos a verdade — retrucou Carter. — Papai não está morto. Ele afundou no chão.
O inspetor Williams olhou para meu avô como se dissesse: Pronto, está vendo? Depois, ele se virou para Carter.
— Mocinho, seu pai cometeu um ato criminoso. E deixou para vocês as consequências.
— Isso não é verdade! — disparei, ouvindo minha voz tremer de raiva.
Não podia acreditar que papai nos deixaria intencionalmente à mercê da polícia, é claro. Mas a ideia de ser abandonada por ele... bem, talvez eu já tenha mencionado, esse é um assunto delicado para mim.
— Querida, por favor — disse vovô — o inspetor só está fazendo o trabalho dele.
— Mal feito! — respondi.
— Vamos todos tomar chá — sugeriu vovó.
— Não! — Carter e eu gritamos ao mesmo tempo, o que me fez me sentir mal pela vovó, que praticamente se encolheu no sofá.
— Nós podemos denunciá-lo — disse o inspetor, olhando para mim. — Podemos e vamos...
Ele parou de repente. Depois piscou várias vezes, como se tivesse esquecido o que estava fazendo.
Vovô estranhou a atitude do policial.
— Ah, inspetor?
— Sim... — o inspetor Williams murmurou sonhador.
Ele pôs a mão no bolso e retirou um livreto de capa azul: um passaporte americano. E o jogou no colo de Carter.
— Você está sendo deportado — anunciou. — Deve deixar o país em vinte e quatro horas. Se precisarmos interrogá-lo novamente, o FBI entrará em contato.
Carter estava boquiaberto. Ele olhou para mim, e eu sabia que não estava imaginando toda aquela situação estranha. O inspetor havia mudado completamente de atitude. Pouco antes se preparava para nos prender, eu estava certa disso, e, de repente, do nada, ele deportava Carter? Até os outros policiais pareciam confusos.
— Senhor? — a policial manifestou-se. — Tem certeza...?
— Quieta, Linley. Vocês dois podem ir.
Os policiais hesitaram até Williams fazer um gesto com a mão, expulsando-os. Então, eles se retiraram e fecharam a porta ao sair.
— Espere aí — disse Carter. — Meu pai desapareceu e você quer que eu deixe o país?
— Ou seu pai está morto ou ele é um fugitivo, filho — respondeu o inspetor. — Deportação é a opção mais generosa. E já foi providenciada.
— Por quem? — quis saber meu avô. — Quem autorizou?
— Foram... — O inspetor adotou novamente aquela expressão estranha, vazia. — Foram as autoridades competentes. Acredite, é melhor do que a detenção.
Carter parecia devastado demais para falar, mas, antes que eu pudesse sentir pena dele, o inspetor Williams olhou para mim.
— E você também, mocinha.
Era como se ele tivesse me atingido com uma marreta.
— Está me deportando? — perguntei. — Eu moro aqui!
— É cidadã americana. E, nas atuais circunstâncias, é melhor você voltar para casa.
Eu o encarei sem dizer nada. Não conseguia me lembrar de nenhuma outra casa além daquela em que eu morava. Meus amigos na escola, meu quarto, tudo o que eu conhecia estava ali.
— Para onde eu vou?
— Inspetor — minha avó falou com voz trêmula — isso não é justo. Não creio que...
— Vou lhe dar tempo para se despedir — o inspetor a interrompeu. Depois franziu a testa, como se estranhasse as próprias atitudes. — Eu... preciso ir.
Nada fazia sentido, e o inspetor parecia perceber que tudo ali era absurdo, mas já se dirigia à porta mesmo assim. Quando ele a abriu, eu quase pulei da cadeira, porque o homem de preto, Amós, estava parado do outro lado. Ele tinha se livrado do casaco e do chapéu, mas ainda usava o mesmo terno risca de giz e os mesmos óculos redondos. Seus cabelos trançados reluziam com contas douradas.
Eu achei que o inspetor ia dizer alguma coisa ou manifestar surpresa, mas ele nem reparou na presença de Amós. Apenas passou por ele e caminhou para a noite.
Amós entrou e fechou a porta. Meus avós se levantaram.
— Você — disparou meu avô, furioso. — Eu devia saber. Se fosse mais jovem, ia surrá-lo até deixá-lo no chão.
— Olá, Sr. e Sra. Faust — cumprimentou Amós. Ele olhou para Carter e para mim como se fôssemos problemas que ele devesse solucionar. — É hora de termos uma conversa.
Amós estava bem à vontade. Ele se acomodou no sofá e se serviu de uma xícara de chá. E comeu um biscoito, o que era bem perigoso, porque os biscoitos da vovó eram horríveis.
Eu tinha a impressão de que a cabeça de meu avô ia explodir. Seu rosto estava vermelho-vivo. Ele se aproximou de Amós pelas costas e levantou a mão como se fosse agredi-lo, mas o homem continuou comendo o biscoito.
— Por favor, sentem-se — disse ele.
E todos nós nos sentamos. Isso era o mais estranho – quase como se esperássemos por sua ordem. Até meu avô baixou a mão e deu a volta no sofá. Ele se sentou ao lado de Amós com um suspiro aborrecido.
Amós bebia seu chá e olhava para mim com algum desprazer. Isso não era justo, eu pensei. Eu não tinha uma aparência tão ruim, considerando tudo o que tínhamos acabado de passar. Em seguida, ele olhou para Carter e grunhiu.
— O momento é péssimo — resmungou. — Mas não tem outro jeito. Eles terão de vir comigo.
— Como disse? — perguntei. — Não vou a lugar nenhum com um desconhecido com o rosto sujo de biscoito!
Ele realmente tinha migalhas de biscoito no rosto, mas, aparentemente, não se importava, porque nem se deu o trabalho de verificar.
— Não sou um desconhecido, Sadie — disse ele. — Não lembra?
Era assustador ouvi-lo falar comigo daquele jeito tão familiar. Eu sentia que devia conhecê-lo. Olhei para Carter, mas ele parecia tão intrigado quanto eu.
— Não, Amós — vovó manifestou-se, tremendo. — Não pode levar Sadie. Temos um acordo.
— Julius rompeu esse acordo hoje — retrucou Amós. — Sabe que não pode mais cuidar de Sadie. Não depois do que aconteceu. A única chance deles é virem comigo.
— Por que iríamos com você a algum lugar? — perguntou Carter. — Você quase brigou com meu pai!
Amós olhou para a bolsa no colo de Carter.
— Vejo que está com a bolsa de seu pai. Isso é bom. Vai precisar dela. Quanto a me meter em brigas, Julius e eu brigávamos muito. Se não percebeu, Carter, eu estava tentando impedi-lo de fazer uma bobagem. Se ele tivesse me ouvido, agora não estaríamos nesta situação.
Eu não tinha ideia do que ele estava falando, mas meu avô parecia entender.
— Você e suas superstições! — exclamou ele. — Eu disse que não queríamos nos meter nisso.
Amós apontou para o quintal nos fundos. Pelas portas envidraçadas era possível ver as luzes brilhando sobre o Tâmisa. Era uma vista belíssima à noite, quando não se podia notar quanto alguns edifícios estavam malconservados.
— Superstição, é? — perguntou Amós. — Mas você achou um lugar para morar na margem leste do rio.
Vovô ficou ainda mais vermelho.
— Foi ideia de Ruby. Ela achou que isso nos protegeria. Mas Ruby se enganou sobre muitas coisas, não é? Por exemplo, ela confiou em Julius e em você!
Amós parecia inatingível. Ele tinha um perfume interessante – temperos antigos, goma-copal e âmbar, como o cheiro das lojas de incenso em Covent Garden. Ele terminou de beber seu chá e olhou diretamente para minha avó.
— Sra. Faust, a senhora sabe o que começou. A polícia é a menor de suas preocupações.
Minha avó engoliu em seco.
— Você... você mudou o pensamento do inspetor. Você o fez deportar Sadie.
— Era isso ou as crianças irem presas.
— Espere aí — interrompi os dois. — Você mudou os pensamentos do inspetor Williams? Como?
Amós deu de ombros.
— Não é nada permanente. Na verdade, precisamos chegar a Nova York na próxima hora, mais ou menos, antes que o inspetor comece a se perguntar por que os deixou escapar.
Carter ria com incredulidade.
— Ninguém consegue ir de Londres a Nova York em uma hora. Nem mesmo o avião mais veloz...
— Não — concordou Amós. — Um avião não consegue. — Ele olhou novamente para vovô como se tudo estivesse resolvido. — Sra. Faust, Carter e Sadie só têm uma opção segura. Sabem disso, não é? Eles irão para a mansão no Brooklyn. Lá poderei protegê-los.
— Você tem uma mansão — disse Carter. — No Brooklyn.
Amós sorriu para ele como se o comentário o divertisse.
— É a mansão da família. Lá vocês estarão seguros.
— Mas nosso pai...
— Vocês nada podem fazer por ele agora — declarou Amós com tristeza. — Lamento, Carter. Explicarei mais tarde, mas posso garantir que Julius ia querer que ficassem em segurança. E, para isso, precisamos ser rápidos. Receio ser tudo o que você tem.
Foi um comentário meio grosseiro, eu achei. Carter olhou para vovô e para vovó. Depois, ele assentiu, triste. Sabia que eles não o queriam por perto. Carter era, para eles, um lembrete constante de nosso pai. E, sim, essa era uma razão estúpida para não acolher o próprio neto, mas era assim.
— Bem, Carter pode fazer o que ele quiser — eu me manifestei. — Mas eu moro aqui. E não vou a lugar algum com um estranho, vou?
Olhei para vovó esperando obter apoio, mas ela olhava para as toalhinhas de renda sobre a mesa como se, de repente, elas fossem muito interessantes.
— Vovô, com certeza...
Mas ele também não olhava para mim. Seus olhos estavam fixos em Amós.
— Pode tirá-los do país?
— Espere aí! — protestei.
Amós levantou-se e limpou as migalhas do paletó. Ele caminhou até as portas envidraçadas e olhou para o rio.
— Logo a polícia estará de volta. Digam o que quiserem aos oficiais. Eles não nos encontrarão.
— Você vai nos raptar? — perguntei, chocada. Olhei para Carter. — Acredita nisso?
Carter pendurou a bolsa no ombro. Em seguida, ele se levantou como se estivesse pronto para partir. Era possível que só quisesse sair da casa de nossos avós.
— Como planeja chegar a Nova York em uma hora? — perguntou ele a Amós. — Já disse que um avião não poderia...
— Não — concordou Amós.
Ele aproximou o dedo da janela embaçada e fez um desenho: outro maldito hieróglifo.
— Um barco — disse eu, percebendo em seguida que tinha traduzido aquilo em voz alta, e eu não deveria saber fazer isso.
Amós olhou para mim por cima dos óculos redondos.
— Como...
— Quis dizer que esse último desenho parece ser de um barco — expliquei, apressada. — Mas não pode ser isso. Seria ridículo.
— Veja! — Carter gritou.
Eu me aproximei dele e da porta que levava aos fundos. No píer, vimos um barco ancorado. Mas não era um barco comum. Não, era um barco egípcio com duas tochas acesas na frente e um grande leme na parte de trás.
Uma figura de casaco longo preto com a cabeça coberta por um chapéu – possivelmente Amós – esperava na posição do condutor da embarcação.
Vou confessar que, pela primeira vez, fiquei sem palavras.
— Vamos viajar naquilo — Carter deduziu — para o Brooklyn.
— É melhor irmos logo — disse Amós.
Eu me virei para minha avó.
— Vovó, por favor!
Ela limpou uma lágrima do rosto.
— É para seu bem, minha querida. Leve Muffin.
— Ah, sim — concordou Amós. — Não podemos esquecer a gata.
Ele se dirigiu à escada. Como se atendesse a um chamado, Muffin desceu nesse momento e saltou para meus braços. E ela nunca fazia isso.
— Quem é você? — perguntei a Amós. Era evidente que eu não tinha opção, mas queria respostas, pelo menos. — Não podemos simplesmente partir com um desconhecido.
— Não sou um desconhecido. — Amós sorriu para mim. — Sou da família.
E, de repente, eu me lembrei daquele rosto sorrindo, dizendo: “Feliz Aniversário, Sadie”. Era uma recordação tão distante que eu quase a tinha esquecido.
— Tio Amós? — perguntei, atordoada.
— Exatamente, Sadie — respondeu ele. — Sou irmão de Julius. Agora, venham comigo. Temos um longo caminho a percorrer.
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As Crônicas dos Kane - CAP. 3

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Aprisionada com minha gata

SADIE


[DÊ LOGO A DROGA DO MICROFONE.]
Oi. Aqui é Sadie. Meu irmão é uma droga como contador de histórias. Peço desculpas por isso. Mas agora eu estou aqui, então tudo vai ficar bem.
Vejamos. A explosão. A Pedra de Roseta em um milhão de pedaços. O diabo de fogo. Papai dentro de um caixão. O francês apavorante e a garota árabe com uma faca. Nós dois desmaiados. Certo.
Assim que acordei, a polícia já estava lá, como era de esperar. Eles me separaram do meu irmão. Eu não me incomodei com essa parte. Ele é mesmo chato. Mas me trancaram no escritório do curador por séculos. E, sim, eles usaram nossa corrente de prender bicicleta para isso. Cretinos.
Eu estava arrasada, é claro. Tinha acabado de ser nocauteada por um sei lá o quê de fogo. Tinha visto meu pai ser encaixotado em um sarcófago e afundar no chão. Tentei contar tudo isso à polícia, mas eles se interessaram? Não.
Pior de tudo: eu sentia um arrepio persistente, como se alguém enfiasse agulhas geladas em minha nuca. Começou quando eu olhei para aquelas palavras azuis e brilhantes que meu pai escrevera na Pedra de Roseta e soube o que significavam. Uma doença de família, talvez? Pode o conhecimento dessas chatices sobre o Egito ser hereditário? Com a sorte que eu tenho...
Muito tempo depois de meu chiclete ter perdido o sabor, a policial finalmente me deixou sair do escritório. Não me fizeram perguntas. Apenas me conduziram até uma viatura policial e me levaram para casa. Mesmo então, não tive permissão para explicar nada a meus avós. A policial simplesmente me levou para meu quarto e lá eu esperei. E esperei.
Não gosto de esperar.
Andei de um lado para o outro. Meu quarto não tinha nada de especial, era só um sótão com uma janela, uma cama e uma escrivaninha. Não havia muito o que fazer ali. Muffin farejou minhas pernas e sua cauda se arrepiou como uma escova de dentes. Acho que ela não gosta do cheiro de museus. Ela sibilou e desapareceu embaixo da cama.
— Muito obrigada — resmunguei.
Abri a porta, mas a policial estava em pé do lado de fora.
— O inspetor virá falar com você logo — informou ela. — Por favor, fique lá dentro.
Eu podia ver lá embaixo: apenas um vislumbre rápido de meus avós andando pela sala, retorcendo as mãos, enquanto Carter e o inspetor de polícia conversavam no sofá. Não consegui ouvir o que eles diziam.
— Posso ir ao banheiro? — perguntei à gentil policial.
— Não.
Ela fechou a porta na minha cara.
Como se eu pudesse provocar uma explosão no banheiro. Francamente.
Peguei meu iPod e examinei a playlist. Nada me interessava. Aborrecida, eu me joguei na cama. Quando estou distraída demais para a música, a situação é realmente triste. Por que Carter tinha sido o primeiro a falar com a polícia? Isso não era justo.
Mexi no colar que papai tinha me dado. Nunca soube ao certo o significado daquele símbolo. O de Carter era um olho, evidentemente, mas o meu parecia um anjo, ou talvez um robô alienígena assassino.
Por que meu pai perguntou se eu ainda tinha o amuleto? É claro que eu ainda o tinha. Era o único presente que ele um dia me dera. Bem, além da Muffin, e com o comportamento daquela gata, eu não sabia se podia chamá-la mesmo de presente.
Papai praticamente me abandonara quando eu tinha seis anos, afinal. O colar era o único elo que eu tinha com ele. Nos dias bons, eu olhava para o amuleto e me lembrava de papai com carinho. Nos dias ruins (que eram muito mais frequentes), eu o jogava do outro lado do quarto e pisava nele, e amaldiçoava meu pai por não estar por perto, uma atitude que eu achava muito terapêutica. Mas, no final, sempre devolvia o pingente ao meu pescoço.
De qualquer maneira, durante toda aquela esquisitice no museu – e eu não estou inventando nada disso — o colar tinha ficado mais quente. Eu quase o tirei, mas não podia deixar de pensar se ele estava realmente me protegendo de alguma forma.
“Farei tudo ser muito melhor”, papai tinha dito com aquela expressão culpada que ele sempre exibe quando está comigo.
Bem, tinha sido um fracasso colossal, pai.
O que ele estava pensando? Eu queria acreditar que tudo não tinha passado de um pesadelo: os hieróglifos brilhantes, o cajado que virava cobra, o caixão. Essas coisas simplesmente não acontecem. Mas eu sabia que não era exatamente assim. Eu não teria sido capaz de sonhar com nada tão horrível quanto o rosto do homem de fogo quando ele se virou para nós. “Em breve, menino”, ele tinha dito a Carter, como se pretendesse nos encontrar.
Imaginar era suficiente para fazer minhas mãos tremerem. Eu também não conseguia deixar de pensar na parada na Agulha de Cleópatra, em como papai tinha insistido em ver aquele lugar, como se estivesse tomando coragem, como se o que ele pretendia fazer no British Museum tivesse alguma relação com minha mãe. Meus olhos vagaram pelo quarto e pararam na escrivaninha.
Não, pensei. Não vou fazer isso.
Mas eu fui até lá e abri a gaveta. Empurrei para o lado algumas moedas velhas, meu estoque de doces, uma coleção de lições de matemática que eu tinha esquecido de entregar e algumas fotos com minhas amigas Liz e Emma, experimentando chapéus ridículos no Camden Market. E embaixo de tudo isso estava o retrato de mamãe.
Meus avós tinham pilhas de fotos. Eles mantinham um altar para Ruby no armário do corredor: trabalhos de arte que minha mãe tinha feito na infância, suas notas sempre fabulosas, a foto da formatura na universidade, suas joias favoritas. É absolutamente doentio. Eu estava determinada a não ser como eles, a não viver no passado.
Mal me lembrava de minha mãe, afinal, e nada podia mudar o fato de ela estar morta. Mas eu guardava aquela única foto. Mamãe e eu em nossa casa em Los Angeles, logo depois de eu ter nascido.
Ela estava em pé na varanda, com o oceano Pacífico atrás, segurando um bebê gordinho e cheio de dobras que um dia cresceria e se tornaria uma pessoa. O bebê nem chamava muita atenção, mas mamãe estava linda, mesmo de short e camiseta velha. Seus olhos eram azuis. Os cabelos louros estavam presos por uma fivela. A pele era perfeita.
Comparada à dela, a minha é deprimente. As pessoas sempre dizem que sou parecida com ela, mas eu não conseguia nem ao menos me livrar das espinhas, quem dirá parecer assim tão linda e madura.
[Pare de fazer careta, Carter.]
A foto me fascinava porque eu quase não me lembrava do tempo que tivemos juntas. Mas a principal razão para eu guardar aquele retrato era o símbolo na camiseta de minha mãe: um daqueles símbolos de vida – um ankh.
Minha mãe, morta, ostentando um símbolo de vida. Nada podia ser mais triste. Mas ela sorria para a câmera como se soubesse um segredo. Como se ela e meu pai compartilhassem uma piada só deles.
Lá no fundo, alguma coisa me incomodava. Aquele homem encorpado no casaco comprido, aquele que estivera conversando com meu pai na frente de casa – ele tinha dito alguma coisa sobre o Per Ankh. Será que ele estava se referindo ao ankh, símbolo da vida? E, se sim, o que era um per? Não podia ser pera, podia? A fruta?
Eu tinha a sinistra sensação de que, se as palavras Per Ankh vissem escritas em hieróglifos, saberia o significado.
Guardei a fotografia de mamãe. Peguei um lápis e virei uma das folhas do dever de casa que eu não tinha chegado a entregar. O que aconteceria se eu tentasse desenhar as palavras Per Ankh? Eu saberia qual era o desenho correto?
Quando encostei o lápis no papel, a porta de meu quarto se abriu.
— Srta. Kane?
Eu me virei e deixei cair o lápis.
Um inspetor de polícia estava parado na porta, sério.
— O que está fazendo?
— Dever de matemática — respondi.
O pé-direito era baixo, por isso o inspetor precisou se abaixar para entrar. Ele vestia um terno de cor neutra, que combinava com os cabelos acinzentados e o rosto pálido.
— Muito bem, Sadie. Sou o inspetor Williams. Vamos conversar, está bem? Sente-se.
Eu não me sentei, nem ele, o que provavelmente o aborreceu. É difícil parecer uma figura de autoridade quando você está curvado como o Quasímodo.
— Fale tudo o que sabe, por favor — pediu ele. — Desde o momento em que seu pai chegou para buscá-la.
— Eu já disse tudo à polícia no museu.
— Conte mais uma vez, se não se importar.
Eu disse tudo de novo. Por que não? A sobrancelha esquerda dele subia cada vez mais, empurrada pelos trechos mais estranhos de meu depoimento, como as letras brilhantes e o cajado que virava serpente.
— Muito bem, Sadie — disse o inspetor. — Você tem uma imaginação incrível.
— Não estou mentindo, inspetor. E acho que sua sobrancelha está tentando fugir.
Ele tentou olhar para as próprias sobrancelhas, depois franziu a testa.
— Escute, Sadie, tenho certeza de que tudo isso é muito difícil para você. Entendo que queira proteger a reputação de seu pai. Mas ele já se foi...
— Foi afundado no chão dentro de um caixão, você quer dizer — insisti. — Ele não está morto.
O inspetor Williams abriu as mãos.
— Sadie, eu sinto muito. Mas precisamos descobrir por que ele praticou esse ato de... bem...
— Ato de quê?
Ele pigarreou incomodado.
— Seu pai destruiu artefatos muito valiosos e, aparentemente, acabou se matando nesse processo. Gostaríamos muito de saber por quê.
Eu o encarei.
— Está dizendo que meu pai é um terrorista? Você é louco?
— Telefonamos para alguns conhecidos de seu pai. Soubemos que o comportamento dele tornou-se estranho depois da morte de sua mãe. Ele se retraiu e desenvolveu certa obsessão por seus estudos, passando mais e mais tempo no Egito...
— Ele é egiptólogo! Você devia estar procurando por ele, em vez de fazer perguntas estúpidas!
— Sadie — começou o inspetor, e sua voz sugeria que ele continha com esforço o impulso de me estrangular.
É estranho, eu sempre provoco esse tipo de reação nos adultos.
— Existem grupos de terroristas extremistas no Egito, e eles não concordam que artefatos egípcios sejam mantidos em museus de outros países. Essas pessoas podem ter procurado seu pai. Talvez, no estado em que estava, seu pai tenha se tornado alvo fácil para eles. Se tiver ouvido ele mencionar algum nome...
Eu passei por ele e fui até a janela. Estava tão furiosa que não conseguia pensar. Eu me recusava a acreditar que papai estivesse morto. Não, não, não. E um terrorista? Por favor! Por que os adultos eram sempre tão idiotas?
Eles sempre repetem “diga a verdade”, e quando você diz, eles não acreditam no que ouvem. De que adianta?
Olhei para a rua escura. De repente, aquela sensação de arrepio gelado ficou pior do que nunca. Foquei a árvore morta onde havia encontrado meu pai mais cedo. No mesmo local, sob uma lâmpada da rua, olhando para mim, estava o sujeito do casaco comprido, dos óculos redondos e do chapéu – o homem que meu pai tinha chamado de Amós.
Suponho que eu deveria me sentir ameaçada ao descobrir que um homem me encarava da escuridão da noite. Mas sua expressão era de autêntica preocupação. E ele me parecia muito familiar. Era irritante não conseguir lembrar por quê.
Atrás de mim, o inspetor pigarreou.
— Sadie, ninguém a culpa pelo ataque ao museu. Compreendemos que você foi levada ao local contra sua vontade.
Eu me virei para ele.
— Contra minha vontade? Eu tranquei o curador no escritório.
A sobrancelha do inspetor voltou a subir.
— Mesmo assim, você não sabia quais eram as intenções de seu pai. É possível que seu irmão esteja envolvido?
Eu ri.
— Carter? Por favor!
— Então, está determinada a protegê-lo, também. Acha mesmo que ele é seu irmão?
Eu não podia acreditar no que ouvia. Queria socar o nariz dele.
— O que você quer dizer com isso? É porque ele não tem a mesma aparência que eu?
O inspetor piscou.
— Eu só quis dizer...
— Eu sei o que você quis dizer. É claro que ele é meu irmão!
O inspetor Williams levantou as mãos pedindo desculpas, mas eu ainda estava furiosa. Por mais que Carter me aborrecesse, eu odiava quando as pessoas imaginavam que nós não éramos irmãos, ou quando olhavam meu pai com espanto quando ele dizia que éramos os três da mesma família. As pessoas olhavam para nós como se tivéssemos feito algo errado. O estúpido Dr. Martin no museu. O inspetor Williams. Acontecia o tempo todo, sempre que papai, Carter e eu estávamos juntos. Todas as vezes.
— Sinto muito, Sadie — desculpou-se o inspetor. — Só quero me certificar de distinguir culpados de inocentes. Vai ser mais fácil para todo mundo se você colaborar. Qualquer informação serve. Alguma coisa que seu pai tenha dito. Pessoas que ele tenha mencionado.
— Amós — falei, só para ver como ele reagiria. — Ele encontrou um homem chamado Amós.
O inspetor Williams suspirou.
— Sadie, isso é impossível. E você com certeza sabe disso. Falamos com Amós há menos de uma hora, e ele nos atendeu por telefone, da casa dele em Nova York.
— Ele não está em Nova York! — insisti. — Está bem...
Olhei pela janela e Amós havia desaparecido. Típico.
— Isso não é possível — afirmei.
— Exatamente — o inspetor concordou.
— Mas ele estava aqui! — exclamei. — Quem é ele? Um dos colegas de papai? Como você sabia para onde devia telefonar?
— Sadie, é melhor parar com a farsa.
— Farsa?
O inspetor me estudou por um momento, depois ergueu o queixo como se tivesse tomado uma decisão.
— Carter já nos disse a verdade. Não queria incomodá-la, mas ele nos contou tudo. Ele entende que é inútil tentar proteger seu pai agora. É melhor que também coopere conosco, e não haverá nenhuma acusação contra você.
— Você não devia mentir para crianças! — gritei, esperando que alguém me ouvisse lá embaixo. — Carter jamais diria uma palavra contra papai, e eu também não direi!
O inspetor não teve nem a decência de se mostrar constrangido. Ele cruzou os braços.
— Lamento que pense dessa maneira, Sadie. Bem, acho que é hora de descermos... para discutir as consequências com seus avós.
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As Crônicas dos Kane - CAP. 2

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Uma explosão de Natal


CARTER

EU JÁ TINHA IDO AO BRITISH MUSEUM ANTES. Na verdade, já tinha estado em mais museus do que gostaria de admitir. Isso me faz parecer um nerd completo.
[Essa é Sadie ao fundo, gritando que eu sou um nerd completo. Obrigado, irmã.]
Enfim, o museu estava fechado e completamente escuro, mas o curador e dois seguranças esperavam por nós na escada da frente.
— Dr. Kane!
O curador era um sujeitinho engordurado metido num terno barato. Eu já tinha visto múmias com mais cabelos e dentes melhores. Ele apertou a mão do meu pai como se estivesse conhecendo um astro do rock.
— Seu último trabalho sobre Imhotep é brilhante! Não sei como traduziu aqueles encantamentos!
— Im-ho-quem? — cochichou Sadie, a meu lado.
— Imhotep — esclareci. — Alto sacerdote, arquiteto. Alguns dizem que era um mago. Projetou a primeira pirâmide com degraus. Você sabe.
— Não sei — respondeu Sadie. — Não me interessa. Mas, obrigada.
Papai agradeceu ao curador por nos receber em um feriado. Depois, pousou a mão em meu ombro.
— Dr. Martin, quero que conheça Carter e Sadie.
— Ah! Seu filho, obviamente, e... — O curador olhou hesitante para Sadie. — E essa jovenzinha?
— Minha filha — respondeu papai.
O rosto do Dr. Martin ficou inexpressivo por um instante. Não importa quanto as pessoas pensam ser receptivas ou educadas, há sempre aquele momento de confusão quando elas percebem que Sadie faz parte de nossa família. Odeio isso, mas, com o passar dos anos, aprendi a esperar essa reação.
O curador sorriu.
— Sim, sim, é claro. Por aqui, Dr. Kane. É uma honra recebê-lo.
Os seguranças trancaram as portas. Eles pegaram nossa bagagem e um deles estendeu a mão para a bolsa de trabalho de meu pai.
— Ah, não. — Papai reagiu com um sorriso tenso. — Eu levo esta aqui.
Os guardas permaneceram no saguão e nós seguimos o curador até o pátio interno, conhecido como Great Court. Era sombrio à noite. A luminosidade pálida do teto abaulado de vidro espalhava sombras que se cruzavam pelas paredes como uma gigantesca teia de aranha. Nossos passos ecoavam no piso de mármore.
— Então — disse meu pai — a pedra.
— Sim! — respondeu o curador. — Mas não sei que nova informação poderá extrair dela. A morte já foi exaustivamente estudada. É nosso artefato mais famoso, é claro.
— É claro — concordou meu pai. — Mas você pode se surpreender.
— O que ele está tramando agora? — cochichou Sadie.
Eu não respondi. Tinha um palpite sobre que pedra eles estavam discutindo, mas não conseguia imaginar por que meu pai nos arrastaria para vê-la na véspera do Natal.
Fiquei me perguntando o que ele quase tinha nos dito na Agulha de Cleópatra: alguma coisa sobre nossa mãe e a noite em que ela havia morrido. E por que ele estava sempre olhando em volta, como se esperasse que aquelas pessoas que surgiram do nada na Agulha aparecessem novamente? Estávamos trancados em um museu cercado por guardas e aparato de segurança de alta tecnologia. Ninguém poderia nos incomodar ali... eu esperava.
Viramos à esquerda na ala egípcia. As paredes eram recobertas por grandiosas estátuas de faraós e deuses, mas meu pai passou por elas e caminhou diretamente para a atração principal no centro da sala.
— Linda — murmurou ele. — E não é uma réplica?
— Não, não — garantiu o curador. — Nem sempre mantemos a pedra verdadeira em exposição, mas, para você... Esta é real.
Olhávamos para um pedaço de rocha cinzenta com cerca de noventa centímetros de altura e sessenta de largura. Estava em um pedestal, dentro de uma cápsula de vidro. A superfície plana da pedra tinha sido entalhada com três linhas distintas de escrita. A linha superior era formada por desenhos que compunham a antiga escrita egípcia: hieróglifos. A linha do meio... tive de vasculhar meu cérebro para lembrar como meu pai chamava aqueles sinais: demótico, um tipo de escrita do período em que os gregos controlavam o Egito, quando muitas palavras gregas se misturaram ao idioma egípcio. A última linha era em grego.
— A Pedra de Roseta — concluí.
— Isso não é um programa de computador? — perguntou Sadie.
Senti vontade de dizer quanto ela era estúpida, mas o curador me impediu com sua risada nervosa.
— Mocinha, a Pedra de Roseta foi a chave para decifrar os hieróglifos! Foi descoberta pelo exército de Napoleão em 1799 e...
— Ah, tudo bem — interrompeu-o Sadie. — Já lembrei.
Eu sabia que ela só queria encerrar o discurso do curador, mas meu pai não desistia tão fácil.
— Sadie — começou ele — até a pedra ser descoberta, simples mortais... Ah, quer dizer, ninguém foi capaz de ler os hieróglifos, por séculos. A linguagem escrita do Egito havia sido completamente esquecida. Então, um inglês chamado Thomas Young comprovou que os três idiomas da Pedra de Roseta transmitiam a mesma mensagem. Um francês chamado Champollion se dedicou a esse trabalho e decifrou o código de hieróglifos.
Sadie mascava seu chiclete sem demonstrar qualquer sinal de interesse.
— O que diz a mensagem, então?
Meu pai deu de ombros.
— Nada importante. É, basicamente, uma carta de agradecimento de alguns sacerdotes do Rei Ptolomeu V. Quando foi entalhada, a pedra não tinha grande importância. Mas, com o passar do tempo... Ao longo dos séculos, ela se tornou um símbolo poderoso. Talvez a mais importante ligação entre o Egito Antigo e o mundo moderno. Fui tolo por não ter percebido seu potencial antes.
Agora eu estava confuso e, aparentemente, o curador também.
— Dr. Kane? — perguntou ele. — Sente-se bem?
Meu pai respirou profundamente.
— Peço desculpas, Dr. Martin. Estava apenas... pensando alto. Será que pode remover o vidro? E se puder buscar os artigos que solicitei, que integram seus arquivos...
Dr. Martin assentiu. Ele digitou um código em um pequeno controle remoto e a frente do vidro se abriu com um estalo.
— Vou precisar de alguns minutos para ir buscar as anotações — disse o Dr. Martin. — Se fosse qualquer outra pessoa, eu hesitaria em permitir acesso irrestrito à pedra, mas sei que você vai ser muito cuidadoso.
Ele olhou para nós como se pudéssemos criar problemas, Sadie e eu.
— Seremos todos muito cuidadosos — prometeu papai.
Assim que os passos do Dr. Martin se afastaram por um corredor, meu pai olhou para nós com uma expressão muito agitada.
— Crianças, isso é muito importante. Vocês precisam sair desta sala e ficar lá fora.
Ele tirou do ombro a alça da bolsa de trabalho e a abriu apenas o suficiente para pegar nela uma corrente de prender bicicleta e um cadeado.
— Sigam o Dr. Martin. Vão encontrar o escritório dele no final do Grand Court, à esquerda. Só há uma entrada. Quando estiverem lá, passem esta corrente por dentro dos puxadores da maçaneta e prendam com o cadeado. Precisamos atrasá-lo.
— Quer que tranquemos o curador no escritório? — perguntou Sadie, subitamente interessada. — Brilhante!
— Pai, o que está acontecendo? — eu quis saber.
— Não temos tempo para explicações — disse ele. — Esta será nossa única chance. Eles estão vindo.
— Quem está vindo? — indagou Sadie.
Papai segurou os ombros dela.
— Meu bem, eu amo você. E sinto muito... Lamento por muitas coisas, mas não temos tempo agora. Se isso der certo, prometo que farei tudo ser muito melhor para nós todos. Carter, você é meu homem valente. Precisa confiar em mim. Lembrem-se, tranquem o Dr. Martin. Depois, fiquem longe daqui!
Acorrentar a porta do escritório do curador foi fácil. Mas, assim que terminamos o trabalho, olhamos para o caminho que havíamos percorrido até ali e vimos uma luz azul surgindo da galeria egípcia, como se nosso pai tivesse instalado nela um gigantesco aquário cintilante.
Sadie olhou para mim.
— Sinceramente: tem alguma ideia sobre o que ele está tramando?
— Nenhuma. Mas ele tem se comportado de um jeito estranho ultimamente. Tem pensado muito na mamãe. Ele guarda a foto dela...
Eu não queria dizer mais nada. Felizmente, Sadie assentiu, indicando que havia entendido.
— O que ele carrega naquela bolsa?
— Não sei. Ele me disse que nunca olhasse dentro dela.
Sadie ergueu uma sobrancelha.
— E você nunca olhou? Meu Deus, é bem sua cara, mesmo, Carter! Você não tem jeito!
Eu queria me defender, mas, nesse momento, um tremor sacudiu o chão.
Assustada, Sadie agarrou meu braço.
— Ele disse que devíamos ficar longe daquela sala. Suponho que vá obedecer essa ordem também.
Na verdade, essa ordem parecia perfeitamente boa para mim, mas Sadie saiu correndo, e, depois de um instante, eu decidi segui-la.
Quando chegamos à entrada da galeria egípcia, paramos de repente. Nosso pai estava em pé diante da Pedra de Roseta, de costas para nós. Um círculo azul brilhava no chão, em volta dele, como se alguém tivesse acendido tubos de neon escondidos sob o piso.
Meu pai tinha tirado o casaco. A bolsa carteiro estava aberta a seus pés, revelando uma caixa de madeira de uns sessenta centímetros de comprimento decorada com imagens egípcias.
— O que ele está segurando? — cochichou Sadie. — Aquilo é um bumerangue?
Com toda certeza, quando meu pai levantou a mão, ele brandia uma espécie de bastão encurvado. Parecia um bumerangue. Mas, em vez de arremessar o objeto, ele o encostou na Pedra de Roseta.
Sadie prendeu o fôlego.
Meu pai estava escrevendo na pedra. Onde o bumerangue encostava, linhas azuis cintilantes surgiam no granito. Hieróglifos.
Não fazia sentido. Como ele podia escrever palavras cintilantes com um bastão? Mas a imagem era clara e brilhante: chifres de carneiro sobre um quadrado e um X.
— Abra — murmurou Sadie.
Eu olhei para ela, porque tive a impressão de que minha irmã tinha traduzido a palavra, mas isso era impossível. Eu vivia com meu pai havia anos e não conseguia ler mais do que alguns poucos hieróglifos. Era algo muito difícil de aprender.
Meu pai levantou os braços. Ele entoou: “Wo-seer, i-ei”, e mais dois símbolos hieroglíficos surgiram azuis e brilhantes na superfície da Pedra de Roseta.
Mesmo perplexo, reconheci o primeiro. Era o nome do deus egípcio da morte.
— Wo-seer — sussurrei.
Jamais ouvira pronunciado daquele jeito, mas sabia que o significado era o mesmo.
— Osíris.
— Osíris, venha — disse Sadie, como se estivesse em transe. Então, seus olhos se arregalaram. — Não! — gritou ela. — Papai, não!
Nosso pai se virou, surpreso.
— Crianças... — começou a dizer.
Mas era tarde demais. O chão tremeu. A luz azul se tornou assustadoramente branca, e a Pedra de Roseta explodiu.
Quando recuperei a consciência, a primeira coisa que ouvi foi uma risada – um som horrível, eufórico – misturado ao alarme do museu.
Eu me sentia como se tivesse sido atropelado por um trator. Estava tonto, e cuspi um pedaço da Pedra de Roseta. A galeria estava em ruínas. Ondas de fogo tremulavam em poças no chão. Estátuas gigantescas estavam caídas. Sarcófagos haviam sido derrubados de seus pedestais. Pedaços da Pedra de Roseta haviam sido arremessados em todas as direções com tanta força que se cravaram nas colunas, nas paredes e nos artefatos expostos.
Sadie estava desmaiada a meu lado, mas não parecia ferida. Eu a sacudi, segurando seus ombros.
— Ugh — resmungou ela.
Diante de nós, onde antes estivera a Pedra de Roseta, havia agora um pedestal fumegante, destruído. O piso estava coberto por uma fuligem escura, exceto pelo círculo azul e brilhante em torno de nosso pai.
Ele olhava em nossa direção, mas não parecia estar olhando para nós. Um corte em sua cabeça sangrava. Ele segurava o bumerangue com força.
Eu não entendia o que ele estava olhando. Então, a horrível gargalhada ecoou novamente pela sala, e percebi que ela soava à direita, à minha frente.
Havia alguma coisa entre meu pai e nós. No início, quase não consegui distinguir – era apenas um calor, uma energia tremulante. Quando me concentrei, porém, pude enxergar uma forma vaga: o nebuloso contorno de um homem de fogo.
Ele era mais alto que papai, e sua gargalhada era cortante, assustadora.
— Bom trabalho — disse ele. — Muito bom trabalho, Julius.
— Você não foi invocado! — A voz de meu pai tremia.
Ele levantou o bumerangue, mas o homem estalou um dedo e o bastão voou de sua mão, estilhaçando-se contra uma parede.
— Eu nunca sou invocado, Julius — respondeu o homem em voz baixa. — Mas quando você abre a porta, deve estar preparado para receber visitas.
— Volte para o Duat! — ordenou meu pai com firmeza. — Eu tenho o poder do Grande Rei!
— Ah, que medo — respondeu o homem de fogo em tom debochado. — Mesmo que soubesse usar esse poder, e você não sabe, ele nunca me dominou. Eu sou o mais forte. Agora vai ter o mesmo destino que ele.
Eu não conseguia entender nada, mas sabia que devia ajudar meu pai. Tentei pegar o fragmento de pedra mais próximo de mim, mas estava tão apavorado que sentia meus dedos imóveis, paralisados. Minhas mãos para nada serviam.
Papai olhou para mim como se dissesse: Saia. Percebi que ele se esforçava para manter o homem de costas para nós, esperando que Sadie e eu escapássemos sem sermos notados.
Sadie ainda estava atordoada. Consegui arrastá-la para trás de uma coluna, para as sombras. Quando ela começou a protestar, cobri sua boca com a mão. Isso a despertou completamente. Ela viu o que acontecia e parou de lutar contra mim.
Alarmes soaram. O fogo bloqueava as portas da galeria. Os seguranças deviam estar a caminho, mas eu não sabia se isso era bom para nós.
Meu pai se abaixou, mantendo os olhos fixos no inimigo, e abriu a caixa de madeira pintada. Tirou dela uma vareta parecida com uma régua. Murmurou algumas palavras, e a vareta se transformou em um cajado do tamanho dele.
Sadie sufocou um grito. Eu também não conseguia acreditar no que via, mas as coisas ficaram ainda mais esquisitas.
Papai jogou o cajado aos pés do homem, e a coisa se transformou em uma enorme serpente – três metros de comprimento e tão larga quanto eu – com escamas acobreadas e olhos vermelhos e brilhantes. Ela atacou o homem, que a agarrou pelo pescoço sem esforço algum. A mão do homem explodiu em chamas, e a cobra queimou até virar cinzas.
— Um truque velho, Julius — debochou o homem de fogo.
Meu pai olhou para nós, silenciosamente nos incentivando a fugir. Parte de mim se negava a acreditar que aquilo fosse real. Talvez eu estivesse inconsciente, tendo um pesadelo. A meu lado, Sadie pegou um fragmento de pedra.
— Quantos? — perguntou meu pai ao homem de fogo, tentando desviar sua atenção de nós. — Quantos eu libertei?
— Bem, os cinco — respondeu ele, como se explicasse alguma coisa para uma criança. — Você devia saber que formamos um grupo, Julius. Logo eu libertarei ainda mais, e todos eles serão muito gratos. Serei nomeado rei outra vez.
— Os Dias do Demônio — lembrou meu pai. — Eles o deterão antes que o fim chegue.
O homem de fogo riu.
— Acha que a Casa pode me deter? Aqueles velhos tolos não conseguem nem parar de discutir entre eles. Deixe que a história seja agora recontada. E, desta vez, você jamais se reerguerá!
O homem de fogo moveu a mão. O círculo azul em torno de meu pai ficou escuro. Papai tentou agarrar a caixa de ferramentas, mas ela deslizou pelo chão.
— Adeus, Osíris — disse o homem de fogo.
Com outro movimento da mão, ele conjurou um esquife cintilante em torno de nosso pai. No início, era transparente, mas, à medida que papai se debatia e batia contra as laterais, o caixão foi se tornando mais e mais sólido: um sarcófago egípcio dourado cravejado de joias. Meu pai olhou para mim uma última vez e moveu os lábios formando a palavra fuja, antes de o caixão afundar no chão, como se o piso tivesse se transformado em água.
— Pai! — gritei.
Sadie arremessou a pedra, mas ela atravessou a cabeça do homem de fogo sem lhe causar dano. Ele se virou, e por um terrível momento seu rosto apareceu entre as chamas. O que eu vi não fazia sentido.
Era como se alguém tivesse sobreposto duas faces diferentes. Uma quase humana, com pele pálida, traços cruéis, angulosos, e olhos vermelhos brilhantes; a outra, como a de um animal de pelagem escura e presas afiadas. Pior que um cachorro, um lobo ou um leão – algum animal que eu jamais tinha visto. Aqueles olhos vermelhos me olharam, e eu soube que ia morrer.
Atrás de mim, passos pesados ecoaram no piso de mármore do Grand Court. Vozes gritavam ordens. Os seguranças, talvez a polícia, porém eles não chegariam a tempo.
O homem de fogo investiu contra nós. Quando ele já estava a poucos centímetros de meu rosto, algo o empurrou para trás. O ar parecia estalar com a eletricidade. O amuleto pendurado em meu pescoço ficou quente a ponto de tornar-se desconfortável.
O homem de fogo sibilou, olhando para mim com mais atenção.
— Então... é você.
O prédio tremeu novamente. Do outro lado da sala, parte da parede explodiu num raio brilhante de luz. Duas pessoas passaram pela abertura: o homem e a garota que tínhamos visto na Agulha, suas vestes tremulando. Ambos seguravam cajados.
O homem de fogo rosnou. Ele me olhou uma última vez.
— Em breve, menino.
Então, toda a sala explodiu em chamas. Uma eclosão de calor sugou todo o ar dos meus pulmões e eu caí. Minha última lembrança é do homem de barba bifurcada e da garota de azul em pé ao meu lado. Ouvi os seguranças gritando, aproximando-se correndo. A garota se debruçou sobre mim e tirou da cintura uma adaga curva.
— Precisamos agir depressa — disse ao homem.
— Ainda não — retrucou ele com alguma relutância. Seu forte sotaque parecia francês. — Devemos ter certeza antes de destruí-los.
Eu fechei os olhos e mergulhei na inconsciência.
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As Crônicas dos Kane - CAP. 1

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Uma morte na Agulha



CARTER

TEMOS APENAS ALGUMAS HORAS, por isso escute com atenção.
Se você está ouvindo esta história, já corre perigo. Sadie e eu podemos ser sua única chance. Vá para a escola. Encontre o armário. Não vou dizer que escola ou que armário, porque, se você é a pessoa certa, vai encontrá-los. A combinação é 13/32/33. Quando você terminar de ouvir a gravação, vai saber o que esses números significam. Lembre-se apenas de que a história que estamos começando a contar ainda não terminou. O final vai depender de você.
O mais importante: quando abrir o embrulho e descobrir o que há dentro dele, não o guarde por mais de uma semana. Sim, será tentador. Mas o que quero dizer é que o que está nele vai lhe dar um poder quase ilimitado. E, se você ficar com ele por muito tempo, isso o consumirá. Domine rapidamente seus segredos e passe-o adiante. Esconda-o para ser achado pela pessoa seguinte, como Sadie e eu fizemos. Depois, prepare-se para ver sua vida ficar bem mais interessante.
Tudo bem, Sadie está me dizendo para parar de enrolar e continuar com a história. Bom, acho que tudo começou em Londres, na noite em que nosso pai explodiu o British Museum.
Meu nome é Carter Kane. Tenho quatorze anos e minha casa é uma mala. Você acha que estou brincando? Desde os meus oito anos, meu pai e eu viajamos pelo mundo. Nasci em Los Angeles, mas meu pai é arqueólogo, por isso seu trabalho o leva a muitos lugares.
Vamos principalmente ao Egito, que é sua especialidade. Entre em uma livraria e encontre um livro sobre o Egito: há uma boa chance de que tenha sido escrito pelo Dr. Julius Kane. Quer saber como os egípcios tiravam o cérebro das múmias, construíram as pirâmides ou amaldiçoaram a tumba do Rei Tut? Meu pai tem a resposta. É claro, há outros motivos para ele ter mudado tanto de lugar, mas naquela época eu ainda não sabia seu segredo.
Não frequentei a escola. Meu pai me dava aulas em casa (se bem que não havia uma casa). Ele me ensinou o que considerava importante, por isso aprendi muito sobre o Egito, sobre estatísticas de basquete e sobre seus músicos favoritos.
Eu também leio muito – qualquer coisa que caia nas minhas mãos, dos livros de história de meu pai a romances de fantasia – porque passo bastante tempo sentado em hotéis, aeroportos e sítios de escavação em países onde não conheço ninguém. Meu pai estava sempre me dizendo para deixar o livro de lado e ir jogar bola. Você já tentou encontrar alguém para bater uma bolinha em Assuã, no Egito? Não é fácil.
Enfim, meu pai me treinou desde cedo para manter todos os meus pertences em uma única mala que caiba no compartimento de bagagens acima do assento nos aviões.
Ele fazia o mesmo, mas tinha direito a uma bolsa extra, do tipo carteiro, para suas ferramentas arqueológicas. Regra número 1: eu não estava autorizado a espiar sua bolsa de trabalho. Essa é uma regra que eu nunca havia quebrado, até o dia da explosão.
Aconteceu na véspera do Natal. Estávamos em Londres, para o dia de visita à minha irmã, Sadie.
Entenda: meu pai só podia passar dois dias por ano com ela – um no inverno, um no verão, porque nossos avós o odeiam. Depois que nossa mãe morreu, os pais dela (nossos avós) moveram uma grande batalha judicial contra meu pai. Após seis advogados, dois socos e um ataque quase fatal com uma espátula (nem me pergunte!), meus avós conquistaram o direito de manter Sadie com eles na Inglaterra. Ela só tinha seis anos, dois a menos que eu, e eles não podiam ficar com nós dois – ou essa foi a desculpa que deram para não ficar comigo também.
Assim, Sadie cresceu nos colégios britânicos, e eu viajei pelo mundo com meu pai. Só a víamos duas vezes por ano, situação que, para mim, estava boa.
[Cale a boca, Sadie. Sim... já vou chegar a essa parte.]
Então, bem, meu pai e eu tínhamos acabado de aterrissar em Heathrow depois de alguns atrasos. Era uma tarde fria e úmida. No táxi, durante todo o trajeto até a cidade, meu pai parecia um pouco nervoso.
Papai é um homem bem grande. Era difícil imaginar algo que pudesse deixá-lo tenso. Ele tem a pele marrom-escura como a minha e olhos castanhos penetrantes, é careca e usa um cavanhaque, o que o deixa com jeito de “cientista do mal”. Naquela tarde, ele estava de casaco e com seu melhor terno, marrom, que costumava usar para as palestras.
Normalmente, ele transmite tamanha confiança que domina qualquer ambiente onde entra, mas, às vezes – como naquela tarde – eu via outro lado dele que não conseguia entender.
Meu pai olhava insistentemente para trás, como se estivéssemos sendo seguidos.
— Pai? — disse quando saíamos da A-40. — Algum problema?
— Nem sinal deles — resmungou. Deve ter percebido que tinha falado alto, porque depois me olhou meio assustado. — Não é nada, Carter. Está tudo bem.
Aquilo me incomodou, porque meu pai mentia muito mal. Eu sempre sabia quando ele estava escondendo algo, mas também sabia que poderia insistir à vontade e nunca conseguiria arrancar dele a verdade. Provavelmente, estava tentando me proteger, embora eu não soubesse de quê. Às vezes, eu me perguntava se ele teria algum segredo sombrio em seu passado, talvez algum antigo inimigo que o perseguia. Mas a ideia parecia ridícula. Meu pai era só um arqueólogo.
Outra coisa que me incomodava: papai estava agarrado à bolsa com o material de trabalho. Com frequência, quando ele faz isso, significa que estamos em perigo.
Como quando atiradores invadiram nosso hotel no Cairo. Ouvi disparos no saguão e desci correndo para ver se havia acontecido algo com meu pai. Quando cheguei lá, ele estava totalmente tranquilo, fechando o zíper da bolsa, enquanto três atiradores inconscientes balançavam no ar, pendurados pelos pés no lustre, as cabeças cobertas pelas túnicas e, à mostra, as cuecas samba-canção.
Papai disse não ter visto nada, e, no fim, a polícia atribuiu a ocorrência a um curto-circuito no lustre.
Em outra ocasião, fomos pegos no meio de um tumulto em Paris. Meu pai escolheu um carro estacionado perto de nós, empurrou-me para dentro, para o banco traseiro, e me disse que ficasse abaixado. Eu me joguei no piso do automóvel e mantive os olhos bem fechados. Podia ouvir meu pai no assento do motorista, vasculhando sua bolsa de trabalho, resmungado algo para si mesmo enquanto a multidão gritava e destruía coisas do lado de fora. Alguns minutos mais tarde, ele me disse que podíamos sair, que era seguro. Todos os outros carros no quarteirão haviam sido virados e incendiados. Já o nosso estava lavado e polido, com várias notas de vinte presas sob os limpadores de para-brisa.
De qualquer maneira, passei a respeitar aquela bolsa. Era nosso amuleto da sorte. E quando papai a mantinha por perto, significava que íamos mesmo precisar de sorte.
Atravessamos o centro da cidade rumo a leste, na direção da casa de meus avós. Passamos pelos portões dourados do Palácio de Buckingham e pela grande coluna de pedra na Trafalgar Square. Londres é um lugar muito legal, mas, depois de viajar por tanto tempo, todas as cidades começam a se misturar.
Quando eu conheço outras crianças, elas costumam dizer: “Puxa, você tem sorte por viajar tanto.” Mas o caso é que não passávamos o tempo conhecendo os lugares, nem tínhamos muito dinheiro para viajar com estilo. Já tínhamos estado em locais bem ruins, e raramente ficávamos por mais de alguns dias. Na maior parte do tempo, era como se fôssemos fugitivos, não turistas.
Quer dizer, ninguém podia imaginar que o trabalho do meu pai era perigoso. Ele faz palestras sobre assuntos como “A magia do Egito pode realmente matar você?”, “As punições preferidas no mundo inferior egípcio” e outros pelos quais a maioria das pessoas não se interessa. Mas, como eu disse, ele tem aquele outro lado. Meu pai é sempre muito cauteloso, verifica cada quarto de hotel antes de entrarmos. Ele entra depressa em um museu, examina seus artefatos, faz as anotações e sai ainda mais rapidamente, como se tivesse medo de ser detectado pelas câmeras de segurança.
Uma vez, quando eu era mais novo, atravessamos correndo o aeroporto Charles de Gaulle para pegar um voo de última hora, e meu pai não relaxou até que o avião decolasse. Perguntei, objetivamente, do que ele estava fugindo, e ele me olhou como se eu tivesse acabado de remover o pino de uma granada. Por um segundo, tive medo de que me dissesse a verdade. No entanto, ele respondeu: “Carter, não é nada.” Como se “nada” fosse a coisa mais terrível do mundo.
Depois disso, decidi que talvez fosse melhor não fazer perguntas.
Meus avós, os Faust, moram em um condomínio perto de Canary Wharf, bem às margens do rio Tâmisa. O táxi parou junto ao meio-fio e meu pai pediu que o motorista esperasse.
Estávamos na metade da calçada quando papai parou. Ele se virou e olhou para trás.
— O que é? — perguntei.
Então eu vi o homem com o casaco comprido. Ele estava do outro lado da rua, apoiado em uma grande árvore morta. Era gordo, com pele da cor de café torrado. O casaco e o terno preto de risca de giz pareciam caros. Os cabelos longos estavam presos em uma trança e ele usava um chapéu Fedora, que de tão baixo no rosto encostava nos óculos escuros redondos. Ele me lembrava um daqueles músicos de jazz a que meu pai sempre me levava para assistir. Eu não conseguia ver seus olhos, mas tinha a impressão de que estavam focados em nós.
Talvez fosse um velho amigo ou colega de papai. Qualquer que fosse nosso destino, meu pai sempre encontrava conhecidos. Mas achei estranho o homem estar esperando ali, do lado de fora da casa de meu avô. E ele não parecia muito satisfeito.
— Carter — disse meu pai — entre na frente.
— Mas...
— Vá buscar sua irmã. Eu encontro vocês no táxi.
Ele atravessou a rua para ir ao encontro do homem de casaco comprido, o que me deixava com duas possibilidades: segui-lo e descobrir o que estava acontecendo ou fazer o que ele tinha mandado.
Decidi pelo caminho menos perigoso. Fui buscar minha irmã.
Antes que eu pudesse sequer bater, Sadie abriu a porta.
— Atrasado, como sempre.
Ela segurava sua gata, Muffin, que tinha sido um presente de “despedida” de meu pai seis anos antes.
Muffin parecia não crescer nem envelhecer. Seu pelo era amarelo e preto, como um leopardo em miniatura, os olhos amarelos eram atentos e as orelhas pontudas pareciam grandes demais para sua cabeça. Um pingente egípcio prateado enfeitava sua coleira. A gata não se parecia muito com um muffin, mas Sadie era pequena quando escolheu o nome, então acho que devemos relevar.
Sadie também não havia mudado muito desde o último verão.
[Ela está aqui do meu lado enquanto gravo, olhando para mim de cara feia, por isso acho melhor tomar cuidado ao descrevê-la.]
Você nunca diria que ela é minha irmã. Para começar, ela mora em Londres há tanto tempo que já tem certo sotaque britânico. Depois, ela puxou à nossa mãe, que era branca, por isso tem a pele muito mais clara que a minha. Seus cabelos são lisos, cor de caramelo – não exatamente louros, mas claros — e ela costuma fazer mechas com cores vibrantes. Naquele dia, tinha mechas vermelhas do lado esquerdo. Seus olhos são azuis.
Estou falando sério! Olhos azuis, como os de nossa mãe. Ela só tem doze anos, mas é tão alta quanto eu, o que é realmente irritante. Sadie mascava chiclete, como sempre, e a roupa que escolheu para passar o dia com papai foi jeans surrados, jaqueta de couro e coturnos – parecia pronta para ir a um show de rock e pisotear algumas pessoas. Os fones de ouvido iam pendurados no pescoço, caso nós a entediássemos muito.
[Bem, ela não me bateu, o que significa que devo ter feito um bom trabalho ao descrevê-la.]
— Nosso voo atrasou — expliquei a ela.
Sadie estourou uma bola de chiclete, afagou a cabeça de Muffin e jogou a gata para dentro de casa.
— Vó, estou saindo!
De algum lugar da casa, vovó Faust disse alguma frase que não consegui ouvir, provavelmente “Não os deixe entrar!”
Sadie fechou a porta e me olhou como se eu fosse um rato morto que sua gata levara para ela.
— Então, aqui estão vocês outra vez.
— É.
— Vamos, então — suspirou Sadie. — Vamos logo com isso.
Ela era assim. Nada de “Oi! Como passou os últimos seis meses? Que bom vê-lo!” ou coisa parecida. Mas eu não me incomodava com isso. Quando você só vê a outra pessoa duas vezes ao ano, ela acaba parecendo mais um primo distante que uma irmã. Não tínhamos absolutamente nada em comum, exceto pai e mãe.
Nós descemos a escada. Eu ia pensando que o perfume de Sadie me lembrava uma combinação de casa de pessoas velhas e chiclete, quando ela parou tão de repente que me choquei contra ela.
— Quem é aquele? — perguntou.
Eu quase tinha esquecido o sujeito de casaco comprido. Papai e ele permaneciam em pé do outro lado da rua, ao lado da árvore grande, e pareciam estar no meio de uma discussão muito séria. Meu pai estava de costas para nós, não dava para enxergar seu rosto, mas eu via que ele gesticulava bastante, como faz quando está agitado. O outro homem fez cara feia e balançou a cabeça negativamente.
— Não sei — respondi. — Ele estava ali quando descemos do táxi.
— Parece que o conheço. — Sadie franziu a testa, como se tentasse lembrar. — Vamos.
— Papai disse que esperássemos no táxi — avisei, mesmo sabendo que era inútil: Sadie já estava andando.
Em vez de atravessar logo a rua, ela disparou pela calçada por meio quarteirão, abaixando-se atrás dos automóveis, depois atravessou para o outro lado e ficou encolhida atrás de um muro baixo de pedras. Então começou a se aproximar de nosso pai sorrateiramente. Eu não tinha alternativa se não fazer o mesmo, embora me sentisse
meio estúpido agindo daquela maneira.
— Seis anos na Inglaterra e ela pensa que é James Bond — resmunguei.
Sadie fez um gesto de desdém, como se espantasse uma mosca, sem olhar para trás, e continuou se movendo. Mais alguns passos e estávamos atrás da grande árvore morta. Eu ouvi meu pai falando do outro lado.
— ... é necessário, Amós. Você sabe que essa é a atitude correta.
— Não — respondeu o outro homem, que devia ser Amós. A voz era grave e firme, bastante obstinada. O sotaque era americano. — Se eu não o impedir, Julius, eles o impedirão. O Per Ankh está atrás de você.
Sadie se virou para mim e moveu os lábios formando as palavras: “Per o quê?”
Eu balancei a cabeça, tão confuso quanto ela.
— Vamos sair daqui — cochichei, porque achava que seríamos notados a qualquer momento, e estaríamos muito encrencados.
Sadie me ignorou, é claro.
— Eles não sabem dos meus planos — disse meu pai. — E quando descobrirem alguma coisa...
— E as crianças? — perguntou Amós.
Os pelos da minha nuca se arrepiaram.
— E quanto a elas? — insistiu ele.
— Já tomei providências para protegê-las — respondeu papai. — Além disso, se eu não fizer nada, todos estaremos em perigo. Agora deixe-nos.
— Não posso, Julius.
— É o que você quer, me enfrentar? — O tom de meu pai tornou-se definitivamente sério. — Não poderia me vencer, Amós.
Eu não via meu pai recorrer à violência desde o Incidente da Grande Espátula, e não estava muito ansioso para assistir àquilo de novo, mas os dois homens pareciam estar indo na direção de um confronto.
Antes que eu pudesse reagir, Sadie se levantou e gritou:
— Papai!
Meu pai pareceu surpreso ao ser abraçado, mas não tanto quanto o outro homem, Amós. Ele recuou tão depressa que tropeçou no próprio casaco.
O homem tinha tirado os óculos, e não pude deixar de pensar que Sadie estava certa: ele parecia familiar, como uma lembrança muito distante.
— Eu... Eu preciso ir — anunciou Amós.
Ele ajeitou o chapéu na cabeça e se afastou apressadamente pela rua.
Nosso pai observou enquanto o homem ia embora, com um braço sobre os ombros de Sadie e uma das mãos no interior de sua bolsa de trabalho, pendurada no ombro. Finalmente, quando Amós dobrou a esquina e desapareceu, papai relaxou. Ele tirou a mão de dentro da bolsa e sorriu para Sadie.
— Oi, meu bem.
Sadie se afastou e cruzou os braços.
— Ah, agora é meu bem, não é? Você está atrasado. O Dia da Visita do Papai está quase acabando! E o que foi isso? Quem é Amós e o que é Per Ankh?
Papai ficou tenso. Ele me olhou como se tentasse perceber quanto da conversa havíamos escutado.
— Não é nada — respondeu, tentando soar animado. — Planejei uma tarde maravilhosa. O que acham de uma visita especial ao British Museum?
Sadie afundou-se no banco traseiro do táxi, entre mim e meu pai.
— Não acredito nisso — resmungou ela. — Só temos algumas horas juntos e você quer fazer pesquisa.
Papai tentou sorrir.
— Meu bem, vai ser divertido. O curador da coleção egípcia nos convidou pessoalmente...
— Certo, grande surpresa. — Sadie soprou a franja de mechas vermelhas para longe dos olhos. — Véspera de Natal, e vamos ver relíquias egípcias emboloradas. Você nunca pensa em outra coisa?
Papai não ficou zangado. Ele nunca se zanga com Sadie. Simplesmente olhou pela janela, para o céu escuro e para a chuva.
— Sim — respondeu ele em voz baixa. — Eu penso.
Sempre que papai ficava assim quieto, olhando para o nada, eu sabia que ele estava pensando em nossa mãe.
Nos últimos meses, isso tinha acontecido bastante. Eu entrava no quarto de hotel e o encontrava com o celular na mão, a foto de mamãe sorridente olhando-o da tela – os cabelos dela presos sob um lenço, os olhos azuis brilhando muito na paisagem do deserto.
Ou estávamos em algum sítio de escavação e eu percebia papai olhando para o horizonte. Sabia que ele estava lembrando como a conhecera: dois jovens cientistas no Vale dos Reis, em uma escavação cujo propósito era encontrar a tumba perdida. Papai era egiptólogo. Mamãe era antropóloga e procurava DNA antigo. Ele tinha contado essa história mil vezes.
Nosso táxi seguia pela margem do Tâmisa. Quando passamos pela ponte Waterloo, meu pai ficou repentinamente tenso.
— Motorista — chamou ele — pare aqui um instante.
O motorista parou na margem Victoria.
— O que é, pai? — perguntei.
Ele saiu do carro como se não tivesse me ouvido. Quando Sadie e eu nos juntamos a ele na calçada, papai estava olhando para a Agulha de Cleópatra.
Caso você nunca tenha visto: a Agulha é um obelisco, não uma agulha, e nada tem a ver com Cleópatra. Acho que os britânicos simplesmente decidiram que o nome soava legal quando levaram o monumento para Londres.
O obelisco tem cerca de vinte metros de altura, o que teria sido realmente impressionante no Egito Antigo, mas, no Tâmisa, com todos aqueles edifícios enormes em volta, parecia pequeno e triste. Era possível passar de carro por ele sem sequer perceber que aquilo era alguma coisa milhares de anos mais velha que a cidade de Londres.
— Meu Deus — Sadie andava em círculos, frustrada. — Precisamos parar em todos os monumentos?
Meu pai olhava para o topo do obelisco.
— Eu precisava vê-lo novamente — murmurou ele. — Onde aconteceu...
Um vento gelado soprou do rio. Eu queria voltar para o táxi, mas meu pai estava começando a me deixar realmente preocupado. Eu nunca tinha visto ele tão distraído.
— O que, pai? O que aconteceu aqui? — quis saber.
— Foi o último lugar onde a vi.
Sadie parou de andar. Ela me olhou carrancuda, confusa, depois olhou para nosso pai.
— Espere aí. Está falando da mamãe?
Meu pai ajeitou os cabelos de Sadie atrás de uma orelha, e ela ficou tão surpresa que nem o empurrou.
Eu tinha a sensação de que a chuva tinha me congelado. A morte da minha mãe sempre fora tema proibido. Eu sabia que ela havia morrido em um acidente em Londres. Sabia que meus avós culpavam papai. Mas ninguém jamais tinha nos contado os detalhes. Eu tinha desistido de perguntar, em parte porque esse assunto o deixava muito triste, em parte porque ele se recusava a me dizer qualquer coisa.
“Quando você for mais velho”, era sua resposta habitual, e a mais frustrante que eu podia ouvir.
— Está dizendo que ela morreu aqui — perguntei — na Agulha de Cleópatra? O que aconteceu?
Ele abaixou a cabeça.
— Papai! — protestou Sadie. — Eu passo por aqui todo dia, e você está dizendo... esse tempo todo... e eu nem sabia?
— Você ainda tem sua gata? — perguntou meu pai, e essa parecia ser uma pergunta bem estúpida.
— É claro que ainda tenho minha gata! — respondeu ela. — O que isso tem a ver com o assunto?
— E seu amuleto?
Sadie levou a mão ao pescoço. Quando éramos pequenos, pouco antes da Sadie ir morar com nossos avós, meu pai tinha dado um amuleto egípcio para cada um de nós. O meu era um Olho de Hórus, um símbolo de proteção popular no Egito Antigo.
Na verdade, meu pai diz que o símbolo moderno do farmacêutico é uma versão simplificada do Olho de Hórus, porque a medicina tem a função de proteger o homem.
De qualquer maneira, eu sempre levo meu amuleto pendurado no pescoço, sob a camisa, mas imaginava que Sadie havia perdido o dela, ou jogado fora.
Para minha surpresa, ela balançou a cabeça em sentido afirmativo.
— É claro que sim, pai, mas não mude de assunto. A vovó está sempre falando sobre como você causou a morte da mamãe. Isso não é verdade, é?
Nós esperamos. Pela primeira vez, Sadie e eu queríamos exatamente a mesma coisa. A verdade.
— Na noite em que sua mãe morreu — começou meu pai — aqui na Agulha...
De repente um raio iluminou a margem. Eu me virei, meio cego, e por um momento vi duas figuras: um homem alto e pálido com uma barba bifurcada e túnica cor de creme, e uma garota de pele acobreada em trajes azul-escuros e com um lenço na cabeça – roupas como eu havia visto centenas de vezes no Egito. Eles estavam ali parados, lado a lado, uns cinco metros distantes de nós, observando-nos. Então, a luz desapareceu. As figuras se fundiram num borrão. Quando meus olhos se acostumaram à escuridão, eles tinham desaparecido.
— Hum... — disse Sadie em tom nervoso. — Viu aquilo?
— Entrem no táxi — ordenou meu pai, empurrando-nos na direção do carro. — Não temos muito tempo.
Desse ponto em diante, papai se fechou.
— Esse não é um bom lugar para conversarmos — comentou, olhando para trás.
Ele prometeu ao motorista do táxi dez libras a mais se ele nos levasse ao museu em cinco minutos, e o homem não media esforços.
— Pai — tentei — aquelas pessoas no rio...
— E o outro cara, Amós — acrescentou Sadie. — São da polícia egípcia ou coisa parecida?
— Ouçam, vocês dois, vou precisar da ajuda de vocês esta noite. Sei que é difícil, mas terão de ser pacientes.  Prometo que vou explicar tudo, depois que chegarmos ao museu. Farei com que tudo fique bem outra vez.
— Como assim? — insistiu Sadie. — O que vai ficar bem?
A expressão de meu pai era mais que triste. Era quase culpada. Senti um arrepio ao pensar no que Sadie dissera: sobre nossos avós culparem papai pela morte da mamãe. Ele não podia estar falando sobre isso, podia?
O táxi entrou na rua Great Russell e parou diante da porta principal do museu com um cantar estridente dos pneus.
— Sigam minhas instruções — indicou meu pai. — Quando encontrarmos o curador, ajam com naturalidade.
Eu achava que Sadie nunca se comportava de um jeito natural, mas decidi ficar quieto.
Descemos do táxi. Peguei nossa bagagem enquanto papai entregava ao motorista um bolo de dinheiro. Depois, ele fez algo estranho. Jogou um punhado de pequenos objetos no banco traseiro. Pareciam pedrinhas, mas estava muito escuro, eu não podia ter certeza.
— Siga em frente — disse ele ao motorista. — Leve-nos para Chelsea.
Isso não fazia sentido, porque já estávamos fora do carro, mas o motorista pisou no acelerador. Eu olhei para meu pai, depois para o automóvel, e antes que o carro virasse na esquina e sumisse na escuridão, estranhei ver três passageiros no banco traseiro: um homem e duas crianças.
Eu pisquei. Era impossível que o táxi já tivesse parado para pegar outros três passageiros.
— Pai...
— Em Londres os táxis não ficam vazios por muito tempo — comentou ele em tom despreocupado. — Venham, crianças.
Ele já se dirigia para a entrada do museu. Por um segundo, Sadie e eu hesitamos.
— Carter, o que está acontecendo?
Eu balancei a cabeça.
— Não sei se quero saber.
— Bem, fique aqui fora, no frio, se quiser, mas eu não vou sair daqui sem uma explicação.
Ela se virou e foi atrás de papai.
Pensando bem, eu devia ter corrido. Devia ter arrastado Sadie para longe dali e me afastado o máximo possível. Mas, em vez disso, passei pela porta de entrada.
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Aviso

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O que você vai ler neste livro é a transcrição de um registro oral. Em certos pontos, a qualidade do áudio era ruim, por isso algumas palavras e frases representam o melhor palpite do autor. Sempre que possível, ilustrações de símbolos importantes mencionados na gravação foram adicionadas.
Ruídos de fundo, como os de xingamentos, agressões e tabefes entre os dois locutores não foram transcritos. O autor não assegura a autenticidade do registro. Parece impossível que seja verdade o que dizem os dois jovens narradores, mas você, leitor, deverá decidir por si.
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A Pirâmide Vermelha

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Desde a morte de sua mãe, Carter e Sadie viveram perto de estranhos. Enquanto Sadie viveu com os avós, em Londres, seu irmão viajava pelo mundo com seu pai, o egiptólogo brilhante, Dr. Julius Kane.
Uma noite, o Dr. Kane traz os irmãos juntos para uma experiência de “pesquisa” no Museu Britânico, onde ele espera para acertar as coisas para sua família. Ao contrário, ele liberta o deus egípcio Set, o deus mais cruel. A fim de detê-lo, os irmãos embarcam em uma perigosa jornada em busca que revelará a verdade sobre sua família e sua ligação com uma ordem secreta do tempo dos faraós.





Capítulo 1 - Uma morte na Agulha 
Capítulo 2 - Uma explosão de Natal
Capítulo 3 - Aprisionada com minha gata
Capítulo 4 -  Raptados por alguém não tão estranho


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As Crônicas dos Kane

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As Crônicas dos Kane é uma série de livros de aventura e fantasia escrita por Rick Riordan. Com o enredo situado nos Estados Unidos e na Inglaterra, os livros são predominantemente baseados na mitologia egípcia.
Os protagonistas da trilogia são os irmãos Sadie Kane e Carter Kane, que também narram a história. Eles descobrem que são descendentes de dois faraós, Narmer e Ramsés, o Grande, e portanto são os magos mais poderosos nascidos em séculos. Aprendem que os seres lendários da mitologia egípcia sempre existiram, como os magos, deuses e monstros.




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